domingo, 30 de setembro de 2012

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FESTA DAS LETRAS


ESCOLAS EM DEFESA DAS LETRAS
José Neres

                Muitos se perguntam o que fazer para que os jovens gostem da chamada cultura letrada (poesia, romance, contos, peças teatrais...). As respostas são muitas. E todas elas passam pelas mesmas variáveis: incentivo da família e da escola. Se a família não apoiar o interesse do aluno pela leitura, todo o trabalho da escola vai por água abaixo. Caso a escola também não tenha projetos que levem os estudantes a procurarem as obras literárias, o esforço de alguns pais também não surtirá tanto efeito.
                Nos últimos anos, uma iniciativa que vem dando certo, pelo menos em parte, é a implantação de pesquisas sobre autores (clássicos e/ou contemporâneos) e  culminância das pesquisas com suas apresentações na própria escola ou em espaços públicos. Devidamente atrelada à estrutura curricular da escola, essas ideias, que quase sempre nascem de iniciativas particulares de professores de língua e literatura, quando encontram apoio do corpo diretivo, têm grande chance de se tornarem sucesso. Mas há casos e mais casos em que o professor (ou a professora) se vê ilhado pelo desinteresse das autoridades escolares e a atividade, que poderia ter um alcance muito grande, ficar restrito às quatro paredes da sala de aula.
                Nos últimos meses, assisti a três eventos dessa natureza e que foram além dos limites da escola. Vou me deter mais no último, por se o mais recente. Em abril, fui à Escola Ciências e fui brindado com um belo espetáculo. Alunos de diversas séries falavam sobre escritores da terra. Jomar Moraes, Joaquim Itapary e Ronaldo Costa Fernandes eram alguns dos homenageados. Professores, alunos, coordenação e direção pareciam irmanados no desejo de fazer um evento de qualidade. E conseguiram.
                Em setembro foi a vez do colégio O Bom Pastor, cujos alunos, em uma parte de manhã dedicada às letras, homenagearam alguns escritores contemporâneos como, por exemplo, Bioque Mesito, Marcos Fábio Belo Matos e José Ewerton Neto. Os alunos, comandados pela professora Priscilla Robertha comentaram, discutiram e recitaram trechos dos autores estudados. Tudo com capricho e muita dedicação.
                Nesses dois eventos, participei como convidado e homenageado, o que me encheu de felicidade e da esperança de que, em um futuro próximo essas crianças, adolescentes e pré-adolescentes se tornem leitores e produtores de nossas letras.
                No penúltimo dia de setembro, participei, na condição de pai, da apresentação da VIII Noite Literária, promovida pelo colégio Cenaza, no Teatro João do Vale. Em uma noite de festa para as letras, para a poesia e, principalmente de homenagem às mulheres escritoras, os alunos trouxeram ao palco nomes como Maria Firmina dos Reis, Cecília Meireles, Cora Coralina e Clarice Lispector, além de incursões por outros gêneros que foram dramatizados.
                Os naturais momentos de nervosismo que antecedem os eventos públicos foram aos poucos substituídos pela confiança de um dever cumprido. Os jovens, muitos deles tendo sua primeira experiência no palco vinham ansiosos, não apenas de uma boa apresentação mas também de mostrarem para pais, parentes, colegas e amigos que têm capacidade de enfrentar um desafio dessa envergadura. A cada cena representada, sentia-se o ar de alívio nas expressões dos alunos e também o brilho de satisfação no rosto dos pais, além da certeza do dever cumprido que se estampava no semblante dos membro do corpo diretivo da escola e dos professores presentes.
                As pequenas falhas podem (e devem ser perdoadas) já que ninguém ali era profissional do teatro. Mesmo assim há de se destacar pelo menos três belos momentos: 1) a bela atuação da aluna que fez o papel da cartomante na peça baseada em A Hora da Estrela – ela, de forma brilhante, demonstrou talento e poder de improvisação diante da plateia; 2) O humor negro do rapaz que reproduziu de forma muito competente o vídeo da freira humorista, muito visto na internet – ele soube tralhar muito bem a voz e as pausas necessárias ao andamento do texto; 3) a excelente montagem da vida de Cora Coralina, que faz a junção entre os aspectos biográficos da escritora goiana com partes de suas composições poéticas.
                No final das apresentações, o professor Tarcísio, o mentor do projeto, consciente de que havia inoculado em alguns alunos o gosto pela leitura e pelas pesquisas literárias, pôde respirar aliviado: aquela tarefa estava cumprida e o amor pelas letras mais uma vez se transformava em realização profissional. Fim de festa, mas não de luta em prol das letras.

CAIS DA SAGRAÇÃO NO TEATRO


CAIS DA SAGRAÇÃO NO TEATRO
José Neres


                Na última quinta-feira do mês de setembro, centenas de pessoas tiveram o privilégio de assistir à peça Cais da Sagração, no Teatro Artur Azevedo. Adaptação do livro homônimo de Josué Montello, o espetáculo serviu para dar ao público uma noção geral do que a obra desse grande romancista maranhense.
                Algumas pessoas esperam ver no palco uma reprodução exata do que se passa nas páginas do livro. O que é impossível, pois são duas linguagens diferentes, que utilizam técnicas e estruturas também diferentes. O romance tem cenas que não foram exploradas pela peça, ao mesmo tempo em que algumas passagens da trama teatral ganharam mais projeção no palco que nas páginas do livro.
                Em aproximadamente uma hora e meia, os atores e atrizes reviveram a saga do polêmico mestre Severino, um homem simples, que carrega dentro de si toda uma gama de ideias e preconceitos que hoje podem soar estranhos, mas que representam muito bem a mentalidade do homem rústico do mar, principalmente se levarmos em consideração a época em que se passa a história.
                Na peça, adaptada por Michelle Cabral, o fluxo do tempo, que é uma das marcas do romance, foi explorando com competência, a partir do jogo cênico presente-passado. Um belo exemplo disso foi a transformação de Lourença, que, ao subir na escadaria do porto para esperar a volta de Severino, com um simples jogo e luzes e com a mudança de vestes, remoça e volta no tempo. A partir desse ponto, o que parecia ainda sem sentido começa a descortina-se com clareza aos olhos do público.
                É, aliás, a personagem Lourença (vivida por Diana Mattos) a responsável pelos melhores momentos da peça. Às vezes sem fala, mas com expressivos jogos de olhares e com marcante expressão facial, ela encantou a plateia com a docilidade de uma mulher que, de uma hora para outra, vê sua vida transformada pela noticia de que seu companheiro irá casar-se com uma meretriz da cidade. É Lourença o fio condutor da história. É ela quem acompanha todo o desenrolar do enredo e que vive os melhore e piores momentos da vida das demais personagens.
                Os demais autores se esforçaram para manter o ritmo e mesmo, vez ou outra, cometendo alguns deslizes, não comprometeram o trabalho e souberam dar vida às personagens, fazendo com que o público não se perdesse na trama. Cada um deles deu o máximo de si para viver personagens complexas e que deixavam as páginas do livro para finarem pés no palco.
                O cenário é um caso à parte. Ele demonstra que, mesmo com poucos recursos financeiros, a criatividade pode sobrepujar as dificuldades e trazer ao palco soluções inventivas e a relativo baixo custo, sem perda dos efeitos cênicos e sem prejuízos para o enredo. O cenário, com seus móveis brancos e seus tapumes, ao ser bem utilizado, transformou-se, sendo reutilizado em diversas cenas com objetivos diferentes, o que acabou dando volume ao espetáculo. Quase ao final do espetáculo, antológica cena da embarcação na tempestade, além de demonstrar o bom gosto de cenografia, serviu para elucidar, para quem não conhecia o texto do romance, os acontecimentos norteadores da trama.
                A peça, de modo geral o Cais da Sagração do teatro satisfaz. É um excelente espetáculo que possivelmente terá algumas rebarbas corrigidas em apresentações futuras. Toda a companhia está de parabéns. Se Josué Montello ainda estivesse entre nós, certamente ela seria o primeiro a levantar-se para aplaudir essa bela adaptação de sua obra.
A casa estava quase lotada, para felicidade de todos os amantes do teatro. O público, como sempre, continua com o péssimo hábito de deixar os aparelhos celulares ligados a alto volume, tirando, em alguns momentos a concentração dos atores, mas isso é algo que um pouco mais de atenção e uma pequena dose de boa educação pode resolver.

FICHA TÉCNICA: direção e cenário de Michelle Cabral (atriz e arte-educadora), elenco Cíntia Pessoa, Diana Mattos, Gilberto Martins, Jurandir Eduardo e Ricardo Torres. Figurinos e adereços de Jurandir Eduardo e iluminação de Nina Araújo.