domingo, 30 de dezembro de 2012

RETROSPECTIVA LITERÁRIA 2012



LITERATURA PELO RETROVISOR DE 2012

José Neres

Quando chega um final de ano, é hora de olhar para trás e ver o que ficou de bom e o que pode melhorar para o ano seguinte. No âmbito literário, se 2012 não foi um ano de grandes surpresas, ele também não pode ser acusado de causar decepções.
O ano praticamente começou e terminou em clima de homenagens. De um lado eram comemorados os 400 ano de fundação da capital maranhense, com direito a lançamentos e relançamentos de livros, saraus literários, encenações de peças teatrais (originais ou adaptadas de outros textos literários) e muitos outros eventos que valorizaram o aniversário de São Luís. Do outro lado, em uma louvável iniciativa da Academia Brasileira de Letras, o ano de 2012 foi também dedicado ao bicentenário do jornalista, publicista e escritor João Francisco Lisboa.
Grande parte do cenário literário do ano foi ocupada pelo genial autor do Jornal de Tímon, que teve sua obra comentada, debatida, estudada e revisitada por diversos intelectuais, como, por exemplo, Jomar Moraes, Antônio Martins de Araújo e Sálvio Dino. Em eventos sempre com bom público, a AML trouxe de volta às prateleiras o livro “Notícias acerca da vida e da obra de João Francisco Lisboa”, de autoria de Antônio Henriques Leal e, na mesma data, além de inaugurar uma placa alusiva ao escritor, também, em parceria com a Editora do Senado, também relançou o volume “O Tímon Maranhense”, de Arnaldo Niskier e, para fechar as homenagens, foram entregues a diversas personalidades a medalha do bicentenário de João Francisco Lisboa.
O ano acadêmico foi de perdas e de ganhos, como sempre acontece. Houve o falecimento do jornalista Neiva Moreira, mas também a posse de Antônio Carlos Lima e de Natalino Salgado, bem como a eleição do Luiz Phellipe Andrés, além de diversos eventos.
No decorrer do ano, outras iniciativas merecem destaque. É o caso do Café Literário, promovido pela Secretaria de Cultura do Estado, sob o comando da escritora Ceres Costa Fernandes. Aos poucos, o público, formado principalmente por escritores, estudantes, professores e pesquisadores, foi se acostumando a, na última terça-feira de cada mês, ouvir os relatos de alguém voltado para as letras. Nomes como Joaquim Haickel, Zelinda Lima, Joila Moraes, Hidelberto Barbosa Filho, Nauro Machado, Inaldo Lisboa e Ubiratan Teixeira, entre outros, abrilhantaram o evento, que começou tímido em suas primeiras edições, mas que agora está solidificado no calendário cultural do Estado.
Outro projeto que também merece ser lembrado é o Papoético, idealizado e levado à prática pelo professor e poeta Paulo Melo Souza. Além de conversas informais sobre artes em geral, palestras e lançamentos de livros, ainda houve a realização do 1º Festival Papoético de Poesia, que teve como grande vencedor o poeta Rodrigo Pereira, com o poema “Ante o espelho”. O evento movimentou as noites de quinta-feira na cidade.
O Instituto Geia continuo na sua missão de levar a literatura às pessoas, seja por meio do já tradicional Festival de Literatura que acontece em São José de Ribamar e que, em 2012, contou com a participação especial da historiadora Mary del Priori, seja com o lançamento e relançamento de livros essenciais para a identidade do povo maranhense, como foi o caso, nesse de O pecado da Gula (Zelinda Lima), A Ilha e o Tempo (Luiz Tavares) e Teatro Escolhido de Fernando Moreira (organizado por Ubiratan Teixeira).
Há de se destacar também o grandioso prêmio recebido pelo crítico e ensaísta Ricardo Leão, que conquistou um dos mais importantes prêmios concedidos pela Academia Brasileira de Letras. Premiados em outros eventos tivemos também José Ewerton Neto e Ferreira Gullar.
Foram muitos os lançamentos de livros realizados durante 2012. Alguns tiveram concorridas sessões de autógrafo, outros ficaram apenas nos círculos de amizade dos autores. Mas o futuro irá lembrar-se da qualidade dos textos e não da quantidade de pessoas presentes ao evento. Vale destacar então alguns livros.

 Memória dos Porcos (Ronaldo Costa Fernandes) o ótimo livro de poemas que leva o leitor a refletir sobre cada página, sobre cada verso.
 O Perdedor de Tempo (Dyl Pires) – Os poemas mostram um amadurecimento temático da poética desse grande escritor e ator maranhense.
 Contos, Crônicas Poemas e outras Palavras (Joaquim Haickel) - Uma mistura de diversos gêneros em um único livro. Bons textos e boa produção gráfica.
Poema da Diferença (Sonia Almeida) – Neste livro a autora mostra uma nova faceta de sua produção literária o jogo metafórico que une o concreto e o abstrato da nossa passagem pelo mundo
Província – O Pó dos Pósteros (de Nauro Machado) – Reunião de diversos artigos de Nauro Machado, todos escritos em um estilo fluido e envolvente.
O Rio (de Arlete Nogueira) – O novo livro de Arlete Nogueira comprova que ela é uma das maiores escritoras de nossas letras.
Pérolas ao tempo (de Rosemary Rêgo) – Menos introspectivo que o anterior, o livro traz uma escritora mais madura e consciente do fazer poético.
Marcas Indeléveis (de Ahtange Ferreira) – Usando o receituário do best-seller, a estreante escritora traz a luta de uma mulher por dias melhores.
Tear (de Quincas Vilaneto) – Excelente livro de poemas. Mistura metalinguagem e visão particular dos ambientes retratado.
A Poesia sou Eu (obra completa de Luís Augusto Cassas em 2 volumes) – essencial para quem deseja mergulhar na produção desse poeta. Além dos livros, traz uma fortuna crítica que auxiliará leitores e pesquisadores da obra de Cassas.
Entre Viana e Viena (Lourival Serejo) – Ótimo livro de crônicas. Nesse livro, Serejo mostra que há múltiplas formas de retratar um evento que às vezes parece ter importância apenas para o cronista, mas que pode abarcar a todos.
Bastidores (Ubiratan Teixeira) – Livro que traz um pouco da movimentação teatral do Maranhão nas últimas décadas.
Ana do Maranhão (Lenita Estrela de Sá) – Relançado trinta anos depois. Esse livro é um marco no teatro maranhense.
Teatro Escolhido de Fernando Moreira – O Instituto Geia e o escritor Ubiratan Teixeira fizeram um grande serviço à literatura trazendo á luz esse importante volume com a obra de um escritor hoje esquecido

 algo que também deve louvado é a fundação ou fortalecimento de academia de letras municipais, como a Paçoluminense, a de Caxias, A Sambentuense, a Imperatrizense e tantas outras que vêm se fortalecendo ano após ano. Com isso, esperamos, haverá uma maior divulgação de valores locais e de suas obras.
Alguns eventos, como o Salão de Livros de Imperatriz (Salimp) e A Feira de Livro de São Luís, ganharam similares, como é o caso o do Salão do Livro de Coelho Neto e das diversas pequenas feiras de livro que foram realizadas durante o ano. E a Capital maranhense ganhou também uma livraria de bom porte em um de seus shoppings, além da livraria Resistência Cultural, que vem ganhando espaço aos poucos. Um avanço para uma cidade que viu diversas livrarias fechando as portas nos últimos anos
Outra iniciativa interessante foi a de alguns escritores de optarem pela publicação de seus livros de forma alternativa, principalmente na internet, como fizeram o professor João de Deus Vieira Barros, que publicou A Bala na Garganta de forma digital e a maranhense radicada na Alemanha Helena Frenzel, que publicou a coletânea 15 Contos Mais na internet, com a participação dos maranhenses José Neres e Marcos Fábio Belo Matos. Além de blogs voltados para as letras, como é o caso do Maranharte, administrado pelo pesquisador Flaviano Menezes.
 Algumas escolas contribuíram para a divulgação da literatura maranhense, convidando escritores e estudiosos das letras para encontros e palestras. Isso foi um marco significativo neste 2012 e certamente terá reflexos em um futuro bem próximo
O principal problema para a literatura maranhense ainda é a falta de divulgação e de forma de escoamento da produção para outros lugares. O livro lançado aqui raramente alcança um público além das linhas divisórias do Estado. As divulgações digitais estão quebrando um pouco essas barreiras, mas ainda falta muito a ser feito. Outro obstáculo é a falta de uma crítica mais atuante no campo das letras. Um livro é publicado e na semana seguinte cai no esquecimento, pois falta um debate mais efetivo acerca do que é produzido aqui. Sem contar que as livraria vem desaparecendo em uma velocidade impressionante.

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

A POESIA DE MARIANA LUZ

OS MURMÚRIOS DE MARIANA
Por José Neres 


            Não é de hoje que as letras maranhenses se ressentem da quase total ausência de uma crítica literária consistente e da falta de um resgate historiográfico dos inúmeros valores que abrilhantam ou abrilhantaram as letras de um estado que já mereceu grandiosos elogios por causa da  produção intelectual de seus inúmeros talentos literários.
            Mesmo hoje, em pleno século XXI, com toda a tecnologia de que dispomos, com os relativos progressos nos métodos de pesquisa e com o hipotético interesse em divulgar as artes e a cultura em geral, o Maranhão ainda se encontra bastante atrasado no que diz respeito à divulgação e aos estudos de suas letras. Não obstante os esforços, às vezes hercúleos, às vezes quixotescos, de alguns pesquisadores como Jomar Moraes, Clóvis Ramos, Carlos Cunha, Rossini Correa e alguns poucos outros, as pesquisas literárias com abordagens mais críticas ainda engatinham em uma terra onde o que não faltam são nomes, obras e temas a serem pesquisados.
            O resultado disso tudo é o quase total esquecimento de alguns autores que muito contribuíram para a formação e para a evolução literária de nossa terra. São inúmeros os nomes esquecidos que clamam por alguém com tempo, conhecimento e disposição para resgatá-los do limbo do ostracismo.
            Um desses escritores que merecem maior atenção por parte dos leitores e da crítica é Mariana Luz, poetisa “de feição simbolista”, como muito bem lembrou certa vez Clóvis Ramos, e que buscava “a arte pura em seus poemas”, como escreveu José de Jesus Moraes Rego, em um dos raros estudos sobre a escritora, mas que também deixou suas contribuições nos campos da prosa e do teatro.
Fonte da imagem:
 http://alvoradanoticias.blogspot.com.br/2011/12/itapecuruenses-notaveis-professora.html
            De toda a não muito vasta obra de Mariana Luz, chegou até nós – principalmente por causa da modesta, mas importante edição de 1990, impressa pelo Sioge –  o pequeno livro de poemas intitulado Murmúrios, uma obra composta por apenas 22 poemas, em sua maioria sonetos.
            Mesmo tentado negar sua condição de poetisa de versos tristes em dois textos dedicados ao poeta Leslie Tavares, em um dos quais chega a afirmar que “para mim tudo é belo e sorridente”, o estro poético da escritora desdiz suas palavras. Basta lembrar que vocábulos como dor, sofrimento, lágrima e cadáver são bastante recorrentes ao longo de seus versos. Poucos são os poemas do livro que não apresentam em sua composição pelo menos uma das palavras supracitadas. Mesmo quando o título aparentemente remete a algo alegre, como é o caso dos poemas “Amanhecer” e “Risos”, o desfecho leva o leitor a uma reflexão sobre a triste condição humana.
            O sofrimento é um dos motes mais contemplados pela autora de Murmúrios. A escritora deixa bem claro em seus versos que só “viveu e sabe dar valor à vida / quem palmilhou a estrada dolorida.” No decorrer do livro, o leitor é facilmente levado a crer na teoria de que bons versos são tirados do sofrimento. Mas fica também a idéia de que a essência do sofrer pode ser disfarçada sob a máscara de uma aparente alegria.
            Em vários momentos, a poética de Mariana Luz remete a uma conexão intertextual com os versos do paraibano Augusto dos Anjos, nem tanto pelo vocabulário carregado de termos científicos, mas, principalmente pelas mensagens recheadas de reflexões sobre a vida e a morte, bem como pelas descrições de cadáveres. Um bom exemplo disso é o soneto dedicado à “Gracinha junto ao féretro de sua mãe”.
            Mariana Luz tem ainda muito a dizer a seus leitores. Uma edição crítica de sua obra seria boa oportunidade de a nova geração conhecer a poesia de uma mulher que, mesmo sem inovações técnicas, soube trabalhar a palavra de forma singular e que soube iluminar nossas letras com a luz e com a  força de seus versos.