quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

LENITA ESTRELA DE SÁ

LENITA: CONTOS DE UMA ESTRELA

José Neres


Depois de encantar o público com poemas, peças teatrais e obras voltadas para o público infanto-juvenil, sempre demonstrando competência e compromisso com as letras, a escritora Lenita Estrela de Sá, com a publicação do livro “Cinderela de Berlim e outras Histórias”, investe também no campo da narrativa curta.

O livro, que é composto de sete contos, foi um das obras premiadas no Plano Editorial Gonçalves Dias. Logo na leitura do primeiro texto, que dá nome ao volume como um todo, pode-se perceber que a autora não está interessada em fazer de sua narrativa um foco de ilusões banais e frívolas. Não! O que ela pretende – e consegue ao longo das páginas – é, a partir de situações aparentemente corriqueiras, mostrar um pouco da dura realidade enfrentada cotidianamente por pessoas que lutam a cada nascer de sol pela sobrevivência.

As personagens dos contos de Lenita Estrela de Sá são geralmente pessoas que vivem a angústia da própria existência. De modo lírico e cru ao mesmo tempo, a escritora faz desfilar pelas páginas de seu livro um conjunto de elementos que podem facilmente ser encontrados nas ruas de qualquer cidade do mundo dito como civilizado.

O fato de as narrativas serem ambientadas em São Luís não interfere no tom universalizante dos textos, pois basta riscar o nome da cidade e ignorar as referências históricas e geográficas que os conflitos retratados se encaixam em variados outros ambientes e sociedades. Isso acontece porque a carga psicológica e a densidade narrativa retratadas em cada conto superam em muito as meras questões regionalistas.

Adultério, sofrimento, preconceito racial, pobreza e crise existencial são alguns dos temas abordados por Lenita Estrela em seu livro. Mesmo o título remetendo à hipótese de um conto de fadas, as histórias não buscam uma solução simplista ou mágica para os problemas apresentados. Na verdade o que há em cada texto é uma janela aberta para que o leitor possa olhar dentro da casa, da vida e da intimidade de cada uma das personagens. Todas elas escondem, por trás de fachadas envernizadas por sorrisos ambíguos, uma essência de dor e de sofrimento.

O que fica visível na leitura dos contos é que as personagens do livro são sempre angustiadas e, mesmo quando conseguem uma projeção econômica, vivem presas a fantasmas do presente e do passado. É o caso do Moreira, dono de uma bela casa, carro de luxo e é bem empregado, mas que vive atormentado pela insana competição com um colega de serviço e pela perda traumática de seu filho, afogado na piscina que serviria como símbolo de ostentação para a família burguesa.

No geral, os contos de “Cinderela de Berlim e outras Histórias” são bem elaborados e trazem um desfecho brusco, cortante. Eles se assemelham a uma lâmina afiada, prestes a decepar os braços da inércia e do comodismo, com o intento de, nesse choque entre ficção e realidade, despertar o senso crítico de um leitor que queira ir além da percepção das obviedades impostas por uma leitura superficial da própria realidade.

Com esse livro, Lenita comprova, mais uma vez, que é uma das brilhantes estrelas dessa bela constelação de escritores contemporâneos.

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